“O passado é uma roupa que não nos serve mais.” (“Velha roupa colorida”, compositor: Antonio Carlos Belchior, álbum: Alucinação, Polygram,1976)
A frase acima é de uma canção do meu conterrâneo, o cearense Belchior. Eu concordo com ele: o passado realmente pode se assemelhar a uma roupa que ficou apertada ou simplesmente saiu de moda e seria piegas demais vesti-la.
Entretanto, ainda na analogia da roupa, podemos dizer que o passado, para muitos de nós, é aquela roupa que não foi doada. Ela ocupa o guarda-roupa de modo que inevitavelmente, embora sem utilidade, permanece diante dos nossos olhos todas as vezes que buscamos o que vestir.
Deixar o passado para trás não é tarefa simples. Já repararam que esquecemos alguns detalhes de nossas vidas com o passar do tempo, mas o passado doloroso, quanto mais nos esforçamos para esquecê-lo, mais vivo ele parece se tornar em nossa mente?
A Bíblia está cheia de personagens com um passado obscuro. Pense em como deve ter sido difícil para Davi deixar para trás a culpa pelo adultério cometido e seguir em frente. Imagine como foi para Maria Madalena, Zaqueu, Pedro e tantos outros. Afinal, depois do arrependimento e do reconhecido perdão de Deus, eles poderiam até estar em paz com o Altíssimo, mas com certeza carregaram por muito tempo, por meio da lembrança deles mesmos ou de outros, o passado nefasto.
Paulo é um exemplo positivo nesse sentido. Ele foi um perseguidor da igreja. No entanto, ele se tornou um fervoroso pregador do evangelho depois que teve um encontro com o Senhor Jesus. Paulo tinha um lema que é bastante conveniente para todos os que desejam deixar o passado para trás.
“[…] uma coisa faço: esquecendo-me das coisas que para trás ficaram e avançando para as que diante de mim estão,
prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus.” (Filipenses 3.13-14)
Todos nós sabemos o quanto pode ser pesado carregar um passado por toda a vida. É especialmente pesado se esse passado foi repleto de erros, más decisões, traumas e dores. Então, eu gostaria de apresentar algumas formas bíblicas de o passado ruim ser deixado para trás.
O momento presente carrega a graça de termos chegado até aqui. Podemos ser gratos porque o passado não nos deixou na situação de trevas em que nos encontrávamos.
Os dias não são iguais. A distância que podemos estabelecer do passado é semelhante ao que o salmista orou.
“Ensina-nos a contar os nossos dias, para que alcancemos coração sábio.” (Salmo 90.12)
É possível olhar para o passado sem ter que voltar para lá; basta não nos esquecermos de onde estamos agora. Isso traz a sabedoria necessária para seguir em frente.
Pode parecer absurda essa colocação, pois, para muitos, a vida se resume naquilo que lhes atinge pessoalmente. Contudo, a Bíblia diz que podemos e devemos viver numa condição que vai além dos nossos próprios interesses.
“Não tenha cada um em vista o que é propriamente seu, senão também cada qual o que é dos outros.” (Filipenses 2.4)
É isso que significa amar ao próximo como a si mesmo (veja Lucas 10.25-37).
Precisamos parar de nos deter demasiadamente em nossa própria dor, como se a estivéssemos cultivando. Assim, poderemos atentar para a dor do outro; dessa forma, a vida ganha outra dimensão. A dor que um dia sofri perde sua força na medida em que me importo com a dor do outro.
Há pessoas que se libertam do passado esquecendo-se mais de si e doando-se mais aos outros. Quem sabe você possa ser uma dessas pessoas.
O passado pode permanecer vivo, ou até mesmo se repetir, caso nossas atitudes continuem as mesmas. Para trilhar um novo caminho, é necessário ter uma nova forma de pensar. A Bíblia convida aqueles que renderam suas vidas a Cristo a isso.
“E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.” (Romanos 12.2)
John Stott diz que esse processo de transformação passa por três estágios.
“Primeiro a nossa mente é renovada pela Palavra e pelo Espírito de Deus; depois nós nos tornamos aptos para discernir e desejar a vontade de Deus; e então vamos sendo cada vez mais transformados por ela.” (John Stott, A mensagem de Romanos, ABU Editora, 2014, pág. 392)
O passado poderá ficar definitivamente para trás se a sua mente for completamente renovada pelo poder de Deus.
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